A partir de certa idade temos o direito de pensar, com certo grau de indulgência, nos “velhos e bons tempos”. Acontecimentos pessoais na semana, somados e textos que pareceram misteriosamente sincronizados com o estado de espírito, contribuem para um passeio em épocas numericasmente não tão distantes, mas em essência paleozóicas se comparadas com o que temos hoje. E a tocante crônica de Ignácio de Loyola Brandão ne domingo, “Apenas Zé”, firmou-me o propósito de ousar ir além das chinelas tecnológicas…
Minha primeira viagem aos EUA foi em 1980, para assistir ao SIGGRAPH em Seattle. À época os gráficos por computador e animações digitais eram foco dos melhores esforços dos computeiros, e o que mais reverberava no público em geral. E tive a honra de ir acompanhando o Prof. Oswaldo Fadigas, grande mestre da Poli e do ITA. Dessa viagem, que também incluiu São Francisco e Boston, me restaram excelentes memórias do comportamento dos norte-americanos, da fidalguia com que tratavam os visitantes, da ilimitanda confiança que deles se podia esperar, Aliás, o Prof, Fadigas, que tinha feito mestrado no MIT, não cansava de citar exemplos que reforçavam o que via em loco. Nenhum problema na entrada, carro alugado sem sequer cartão de crédito, voos funcionando pontualmente, e ainda aproveitamos para ver o recém lançado: “O Império Contra-ataca”! De lá pra cá muita coisa mudou. Hoje o tratamento na imigração é bem mais duro, a violência é mais presente, o apego à honra e à correção parece bastante empalidecido.Em outro tema, comento – sem discutir o mérito – uma decisão da Suprema Corte norte-americana que deu ganho de causa a uma projetista de sítios web para casamentos, que se recusava a fazer sítios para “casais não tradicionais” (detalhes podem ser buscados sob “case 303 Creative v. Elenis”). O que me chamou a atenção – e pode ser útil em debates por aqui – é que a Corte traçou uma linha entre o que seria um “common carrier” - um serviço prestado indistintamente ao público, como telefonia, correios, etc - e o que é uma iniciativa limitada, que poderia restringir-se a seus princípios. A Corte, chamando à cena a Primeira Emenda, faz uma analogia entre direito à fala e uma publicação na Internet, defendendo que ninguém pode ser obrigado a “falar” algo com que não concorda. Ou seja a Corte garantiu à projetista o direito de “não falar” algo. Sem entrar no mérito da decisão e das idiossincrasias dos diferentes estamentos jurídicos, o que aqui me parece relevante e digno de mais discussão é essa taxonomia entre o que deveria ser atendido igualmente, por todos, e o que é limitado, a talante de seu provedor.
De minha pequena janela da engenharia, não ouso avaliar o que se passa com o homem atual e assim recorro a Chesterton,“O que há de Errado com o Mundo”: “o homem perdeu seu caminho. Ele tem sido um andarilho desde o Éden mas, ao menos, sempre soube (ou achava que sabia) o que procurava. <...> Pela primeira vez na história, ele começa realmente a duvidar do objeto de suas andanças pela Terra… Ele, que sempre houvera perdido o caminho, agora parece que ele perdeu o próprio endereço”…
"Man has always lost his way. He has been a tramp ever since Eden; but he always knew, or thought he knew, what he was looking for. But in the bleak and blinding hail of skepticism to which he has been now so long subjected, he has begun for the first time to be chilled, not merely in his hopes, but in his desires. For the first time in history he begins really to doubt the object of his wanderings on the earth. He has always lost his way; but now he has lost his address."
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