terça-feira, 12 de outubro de 2021

Quem tem um...

Outubro começou com um inesperado evento: numa segunda-feira, logo após o horário do almoço no Brasil, perdeu-se o acesso a três das mais usadas redes sociais, Facebook, Instagram e Whatsapp. Sem mais essa nem aquela, ficaram inacessíveis ferramentas usadas em seu dia-a-dia por quase metade da humanidade. Qualquer que tenha sido o motivo que acarretou essa queda geral, seus efeitos foram muito sentidos e, especialmente aos que centram sua atividades nestas plataformas, devastadores.

A Internet foi concebida como uma interligação de milhares de redes, e altamente distribuida, evitando-se um ponto único de falha. Na rede, um sítio pode sair do ar, um servidor de correio eletrônico pode experimentar um apagão, um cabo óptico submarino pode se romper, e teremos em todas essas situações impactos que variarão de intensidade e afetarão diferentemente seus usuários. Uma plataforma gigantesca com as citadas, entretanto, concentra em si mesma diferentes serviços. Emitentes, destinatários e conteúdo estão no mesmo barco e dependendo da mesma infraestrutura centralizada. Uma falha importante, que desative momentaneamente a plataforma, atingirá de forma incontornável todos os seus participantes e suas múltiplas expectativas de comunicação.

Muitas vezes a participação em redes sociais é também o lenitivo para as agruras do dia-a-dia e formas de prover entretenimento distração. Claro que sem chegar ao extremo da adicção, de nos tornarmos compulsivamente dependentes da interação nas redes em busca de uma gratificação emocional (em Admirável Mundo Novo, Huxley descreve o uso do “soma”, droga que traz a felicidade, a diversão e a despreocupação: “’soma’ é tão bom como o álcool e a religião, e sem os seus problemas”). Mas as plataformas operam também como importantes canais de informação e, frequentemente, como ambientes em que se exerce atividade profissional. O Whatsapp por exemplo, que começou como um sucedâneo da telefonia comercial, em pouco tempo passou a ser uma forma importante de comunicação instantânea entre usuários e comunidadas. Em comparação com o correio eletrônico, que é um processo assíncrono onde o diálogo segue um ritmo mais ameno definido pelas disponibilidades dos interlocutores, os mensageiros digitais substitutos da telefonia tendem a assumir seu mesmo comportamento síncrono, onde a mensagem “pede” para ser lida e respondida em tempo curto. Uma falha neste tipo de mensageria pode causar, portanto, lapsos sérios em comunicações comerciais e profissionais, indo bem além da simples perda de informação e entretenimento.

O ditado português que o título sugere reza que “quem tem um, não tem nenhum”. Ou seja, se dependemos de um serviço específico, sem alternativas, mais hora menos hora teremos que nos haver com o problema de sua indisponibilidade. E essa indisponibilidade será mais crítica se o serviço em questão for usado em atividades profissionais diárias. Logo, é de bom alvitre ter cartas na manga para o caso de falhas em serviços importantes.

Finalmente, o ditado parece que também serviria à perfeição para o que aconteceu tecnicamente neste o caso. Pelo que se soube - e que parece bastante crível - houve uma concentração de servidores críticos como o DNS, que gera endereços de acesso às plataformas, em uma única estrutura de rede, num único “sistema autônomo”. Quando, por algum motivo durante uma reestruturação da rede local, o caminho para esse sistema autônomo deixou de ser encontrável na Internet, o mundo passou a não localizar mais esses servidores. E, para complicar, as tres plataformas estavam presentes conjuntamente nessa única rede… Sem redundância, “quem tem um, não tem nenhum”...

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O provérbio português:
https://quemdisse.com.br/frase/quem-tem-um-nao-tem-nenhum/65957/



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Informações sobre a provável causa técnica do problema:

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Referências ao "soma" em Admirável Mundo Novo, Aldous Huxley

"And there's always soma to calm your anger, to reconcile you to your enemies, to make you patient and long-suffering. In the past, you could only accomplish these things by making a great effort and after years of hard moral training. Now, you swallow two or three half-gramme tablets, and there you are. Anybody can be virtuous now. You can carry at least half your morality about in a bottle. Christianity without tears-that's what soma is."

..there is always soma, delicious soma, half a gramme for a half-holiday, a gramme for a week-end, two grammes for a trip to the gorgeous East, three for a dark eternity on the moon…”

Hug me till you drug me, honey; Kiss me till I'm in a coma: Hug me, honey, snuggly bunny; Love's as good as soma.”





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