terça-feira, 29 de setembro de 2020

Internet e a Química

Sábados são ótimos dias para reencontrar os amigos. Nos dias de hoje, eles chegam mascarados, falam menos, evitam abraços e apertos de mão. Não raro trazem uma garrafinha de álcool para as unções higiênicas… Superado o delicado momento do protocolo, chega a hora de, afinal, remover as máscaras para tomar a cervejinha de praxe… Claro, há cuidados com os tremoços e as castanhas de caju, porque são levados à boca pelos comensais e, a mão agora infecta, volta ao pote dos acepipes…

Bebendo o néctar dos sábados, uma discussão surge: sobre o processo adequado de fabricação da boa cerveja. A lei de pureza alemã, de mais de 500 anos, reza necessários e suficientes apenas tres elementos: água, malte e lúpulo. Seguem-se sofisticados processos de fermentação, onde toma parte a Saccharomyces cerevisae, filantrópica levedura que transforma o inútil açúcar original no revigorante álcool do loiro elixir. E arricaram-se alguns palpites sobre qual a melhor velocidade da fermentação, e o papel de enzimas. Enzimas são catalisadores naturais: aceleram uma reação, mas dela não tomam parte, nem são consumidas… Catalisadores são os “agitadores especialistas” das reações químicas, empurrando os participantes uns contra os outros de forma que a reação aconteça vigorosa e rapidamente!

E no polarizado mundo de hoje? É inegável que os componentes necessários para qualquer “reação química” humana sempre existiram. Os partidários do credo A e os do B, os tolerantes e os irascíveis, os homens e as mulheres, a infinidade de culturas e costumes, os velhos e os jovens, minorias diversas, as diversas instâncias em que há oprimidos e os opressores, os que se consideram prejudicados e os que prejudicam (“pré-judicar” seria julgar a priori, ter um “pré-conceito”). Para haver “reações humanas” sempre contou-se com os reagentes necessários presentes, e à disposição. Também os catalizadores, agitadores à maneira das enzimas, estão presentes. Atiçam e não são consumidos, como sempre foi.

O que impedia ou moderava esta possível “fervura” social era o distanciamento. Raras vezes encontrava-se “massa crítica” localizada para levar à explosão. Claro que, de tempos em tempos e em alguns lugares, juntava-se a quantidade de “reagentes” necessários para haver um conflito sério. Assim se formaram guerras, cruzadas, a revolução francesa, outras revoluções, e tantos outros agitados e violentos episódios.

Esse distanciamento moderador desapareceu em nossos dias com o fenômeno da disseminação rápida e ampla da Internet. Se todos os componentes já estavam por aqui, a Internet fez ainda mais. Qual uma colher de pau no tacho, ela misturou tudo! Os “reagentes”, a postos localmente, mas sem o volume necessário, encontraram seus pares em outras regiões do mundo. Os agitadores, que buscam acelerar reações, passaram agora a exercer seu efeito catalítico urbi et orbi… Uma enorme quantidade de “reações químicas” humanas, latentes, floresceu instantaneamente. Não é, portanto, de causar estranheza o que se vê. Estímulados pelos catalisadores, liberamos sem peias, e muitas vezes sem medir consequências, boas e más energias. Todos participam avidamente dos muitos conflitos, enquanto a “colher de pau” da Internet continua mexendo energicamente a mistura.

Sem dúvida foi uma benção contarmos com os catalisadores para produzir uma ótima cerveja. Já quanto ao caso da catálise favorecida pela Internet, pode haver dúvidas… A química das reações humana é complexa. Mesmo a misteriosa química convencional é de compreensão difícil. Afinal, durante as aulas da matéria no colegial dos anos 60, já proclamávamos alto e com humor: “eu odeio química!”.

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uma boa descrição sobre cervejas:
https://peqengenhariajr.com.br/processo-de-producao-de-cerveja/

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Machado de Assis já tinha antecipado:


http://www.citador.pt/frases/o-tempo-e-um-quimico-invisivel-que-dissolve-com-joaquim-maria-machado-de-assis-17521


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