“Demônio” carrega usualmente um sentido de malefício, de destruição, de pecado. Nem sempre teve, porém, essa semântica: no grego antigo “demon” (daimon) era algum espírito poderoso, eventualmente divino, sem nenhuma conotação maligna. Em computação o termo “demon” pode se referir a um programa que executa tarefas auxiliares num sistema, nem sempre visíveis ao usuário comum. Outro exemplo: a tradução do título do livro de Nikos Kazantzákis, “Zorba, o Grego”, que se usa em Portugal é “O Bom Demónio”... Se olharmos para o que os gregos entendiam por demônio faz todo o sentido chamar seu protagonista, um espírito livre, criativo e puro, de “bom demônio”.
Mas o que vem a fazer esses “demônios” no texto? Por partes: nesta semana a discussão sobre Inteligência Artifical, seus eventuais amplos benefícios e seus potencialmente fatais riscos, ocupou a cena do debate tecnológico. Divergiram publicamente sobre IA, de um lado o sul-africano Elon Musk, criador da SpaceX e da Tesla, talentoso e audacioso empreendedor, e de outro Mark Zuckerberg, o quinto na atual lista de multibilionários do mundo, dono do Facebook e adjacências... Um debate interessante, especialmente porque Musk, com raízes profundas em projetos de Inteligência Artificial, foi quem surpreendentemente advertiu os governos sobre a necessidade de se buscar maior entendimento quanto aos riscos que essa tecnologia traz. Do outro lado da cerca, Zuckerberg defendeu ardorosamente pesquisas ilimitadas na área, apontando apenas benefícios que ela trará à humanidade.
Podemos ser pessimistas quanto à IA e avaliar que ela destruirá empregos e que ao atingirmos a “singularidade” de Ray Kurtzweil, ou seja, quando as máquinas superarem a capacidade intelectual humana, a própria espécie estará em risco. Que andróides, meio humanos meio máquinas, dominarão o mundo e todo um porvir terrificante da nem-tanto-ficção científica. Podemos ser otimistas como Vint Cerf, que imagina o poder ilimitado do “software” ajudando-nos nas tarefas mais difíceis e tediosas, examinando com eficiência bases gigantescas de dados (“big data”) para tirar conclusões mais corretas do que conseguiríamos sobre diagnósticos médicos, ou como aperfeiçoar processos e sistemas. Seja qual for nossa posição, entretanto, o inarredável é que IA deve ser levada em conta seriamente.
No final de 2016, o IEEE (Instituto de Engenheiros Elétricos e Eletrônicos) publicou um documento de mais de 100 páginas chamado “Projetos Eticamente Alinhados” em que abre à discussão pública, exatamente, a necessidade de se incluir a ética entre os principais componentes de um projeto tecnológico, notadamente os de Inteligência Artificial. No sumário do documento aparece a busca da “eudemonia” - um termo cunhado por Aristóteles em Ética a Nicômaco - para definir o que seria o maior anelo do ser humano: viver uma vida plena, com bom espírito e felicidade. Em “eudemia” “eu” significa “bom” e “demon”, no contexto grego original, “espírito”. Aliás essa “busca pela felicidade” também aparece como um dos direitos inalienáveis do Homem na Declaração de Independência dos Estados Unidos.
Estamos, portanto, numa encruzilhada ética, tecnológica, mas também semântica: o demônio que invocaremos será uma espécie de Zorba, … ou de Mefistófeles?
Mas o que vem a fazer esses “demônios” no texto? Por partes: nesta semana a discussão sobre Inteligência Artifical, seus eventuais amplos benefícios e seus potencialmente fatais riscos, ocupou a cena do debate tecnológico. Divergiram publicamente sobre IA, de um lado o sul-africano Elon Musk, criador da SpaceX e da Tesla, talentoso e audacioso empreendedor, e de outro Mark Zuckerberg, o quinto na atual lista de multibilionários do mundo, dono do Facebook e adjacências... Um debate interessante, especialmente porque Musk, com raízes profundas em projetos de Inteligência Artificial, foi quem surpreendentemente advertiu os governos sobre a necessidade de se buscar maior entendimento quanto aos riscos que essa tecnologia traz. Do outro lado da cerca, Zuckerberg defendeu ardorosamente pesquisas ilimitadas na área, apontando apenas benefícios que ela trará à humanidade.
Podemos ser pessimistas quanto à IA e avaliar que ela destruirá empregos e que ao atingirmos a “singularidade” de Ray Kurtzweil, ou seja, quando as máquinas superarem a capacidade intelectual humana, a própria espécie estará em risco. Que andróides, meio humanos meio máquinas, dominarão o mundo e todo um porvir terrificante da nem-tanto-ficção científica. Podemos ser otimistas como Vint Cerf, que imagina o poder ilimitado do “software” ajudando-nos nas tarefas mais difíceis e tediosas, examinando com eficiência bases gigantescas de dados (“big data”) para tirar conclusões mais corretas do que conseguiríamos sobre diagnósticos médicos, ou como aperfeiçoar processos e sistemas. Seja qual for nossa posição, entretanto, o inarredável é que IA deve ser levada em conta seriamente.
No final de 2016, o IEEE (Instituto de Engenheiros Elétricos e Eletrônicos) publicou um documento de mais de 100 páginas chamado “Projetos Eticamente Alinhados” em que abre à discussão pública, exatamente, a necessidade de se incluir a ética entre os principais componentes de um projeto tecnológico, notadamente os de Inteligência Artificial. No sumário do documento aparece a busca da “eudemonia” - um termo cunhado por Aristóteles em Ética a Nicômaco - para definir o que seria o maior anelo do ser humano: viver uma vida plena, com bom espírito e felicidade. Em “eudemia” “eu” significa “bom” e “demon”, no contexto grego original, “espírito”. Aliás essa “busca pela felicidade” também aparece como um dos direitos inalienáveis do Homem na Declaração de Independência dos Estados Unidos.
Estamos, portanto, numa encruzilhada ética, tecnológica, mas também semântica: o demônio que invocaremos será uma espécie de Zorba, … ou de Mefistófeles?
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https://link.estadao.com.br/noticias/geral,o-bom-demonio,70001927534
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https://www.custojusto.pt/lisboa/desporto-lazer/livros/-o-bom-demonio-de-nikos-kazantzaki-30637879
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